As redes sociais trouxeram desafios para todos, empresas e particulares, quer sejam usadas para fins profissionais ou no uso comum do dia-a-dia. Para lá de tudo aquilo que já nos definia, passámos a ter uma “identidade digital”, que pode ser usada para o bem ou para o mal. Ser e parecer nunca foram dois conceitos tão distintos como hoje, e isso, naturalmente, traz riscos aos quais todos devemos estar atentos.

Isto é verdade para tudo o que fazemos na internet, mas, no contexto noticioso, esta análise torna-se particularmente desafiante. Somos bombardeados com informação vinda de todo o lado e, se é verdade que nunca foi tanta, também é verdade que nunca foi de tão má qualidade. Ruído, mentiras ou meias-verdades, as redes sociais estão repletas de desinformação e é responsabilidade de cada um de nós analisar com critério aquilo que consumimos.

Nas redes sociais, uma mentira pode ganhar escala e arruinar a reputação de uma pessoa ou de uma empresa. Um vídeo partilhado na altura errada pode ser atribuído a um evento com o qual não tem ligação. Uma campanha contra algo ou alguém pode ser desencadeada unicamente para promover os interesses de outros. Porque a informação é tanta, somos mais permeáveis a cometer erros ou a acreditar neles – e o desafio é maior para os profissionais de comunicação.

Luís Manso, jornalista da SIC que em 2017 elaborou uma Grande Reportagem sobre a problemática das Fake News, explica à Llorente & Cuenca como o aparecimento do “cidadão repórter” pode ajudar a explicar este fenómeno: “com as redes sociais abriu-se a janela para a disseminação de conteúdos em redes com milhares de milhões de pessoas, virtualmente, ligadas. As notícias produzidas dentro duma redação circulam a par desses mesmos conteúdos, muitos deles manipulados e desviados da verdade”.

O problema torna-se ainda maior porque, acrescenta, “uma notícia falsa surge na janela do Facebook com o mesmo enquadramento gráfico, destaque ou peso. Não existe distinção, o que fragiliza os meios de comunicação social. Além do mais, a procura do lucro fácil com o Clickbait, com títulos atrativos e artigos sem conteúdo útil para a sociedade, contribui, igualmente, para o declínio da credibilidade jornalística”.

O suposto apoio do Papa a Donald Trump ou a possível alteração do hino nacional para uma versão mais atual são alguns exemplos de Fake News relatadas na Grande Reportagem A verdade sobre a mentira. Com a informação distribuída nas redes sociais a ganhar um peso tão relevante aos olhos da população, que acredita muitas vezes naquilo em que quer acreditar, os jornalistas estão obrigados a fazer uma análise muito mais rigorosa de tudo o que lá é partilhado – o que não significa que alguns conteúdos não possam, ou não devam ser utilizados.

Em 2015, durante o pico da crise da dívida grega, as tensas negociações para um novo pacote de apoio ao país estiveram perto de resultar no abandono da moeda única por parte da Grécia. Foram semanas de longas negociações no Eurogrupo, o organismo que reúne os ministros das Finanças da Zona Euro, e nessa altura, já antes de Donald Trump usar o Twitter como arma de arremesso incontornável para os jornalistas, era nessa rede social que os ministros contavam, em tempo real, os avanços nas negociações. Alexander Stubb, o então ministro das Finanças da Finlândia, era um dos mais ativos, informando, ainda antes das comunicações oficiais, sobre o rumo dos acontecimentos.

Mas se a informação dada por um ministro das Finanças pode e deve ser utilizada como fonte para profissionais de comunicação e de outras áreas, já a distribuída por meios não oficiais deve obrigar a maiores cuidados. Ainda durante as negociações do resgate grego, uma publicação no Twitter que apontava para o sucesso das conversações mexeu com os mercados financeiros e levou o Euro a disparar face ao Dólar. No final do dia, tudo não passava de um rumor.

O terreno é fértil para dúvidas quanto ao uso ou não da informação proveniente de redes sociais. Até mesmo o conceito do “cidadão repórter”, que em alguns casos pode dar origem informação não fidedigna, noutros poderá servir para complementar o exercício jornalístico com testemunhos que, de outra forma, nunca seriam conseguidos. Nos atentados de Paris, Nice, Londres ou Barcelona as primeiras imagens que surgiram foram captadas com telemóveis e posteriormente partilhadas no Twitter. São filmagens em bruto, duras e que obrigam a um exercício de seleção feito com bom senso. Em Portugal, os incêndios do verão do ano passado originaram filmagens únicas, como só o acaso permite.

Os conteúdos partilhados nas redes sociais são cada vez mais uma fonte imediata para os órgãos de comunicação social, pressionados a responder à velocidade das redes sociais. Essa realidade dificilmente irá mudar, mas obriga a que seja feita uma reflexão por parte de quem escolhe os conteúdos. Os jornalistas, que decidem expor alguns destes conteúdos, devem estar conscientes de que, quando os utilizam, lhes estão a conceder um selo de aprovação/veracidade aos olhos da população que vê nos meios de informação tradicionais uma garantia de qualidade. Se esse selo de aprovação não for antecedido de uma análise séria e rigorosa, esta relação de confiança corre o risco de se perder – e aí só ganhará a desinformação. Uma sociedade desinformada é uma sociedade mais pobre.